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domingo, 6 de fevereiro de 2011

Malditos Sonhos Malditos

Plena quarta feira e cá estou, indo para o trabalho – novamente – para ganhar o suado pão de cada dia dado pelo chefe mais chato, esquisito e sem graça do mundo. Passo pelo Trianon, atravesso a Augusta e sigo caminhando pela Consolação. A linha verde me espera.
Vejo todos os tipos de pessoas. De pobres a ricas, de bebês a idosos, de relaxados a ansiosos. Tudo como deveria ser. Que dia chato, meu Deus! E assim sigo, falando em divindades que acredito que não existam.
Chegando naquela empresa cafifenta, me deparo com a cara emburrada das pessoas, em especial, o chefe que, não contente com seus funcionários, demite um a cada hora. A empresa está ficando vazia por culpa deste homem incompetente. Espero um dia poder dizer isso na cara dele.
O dia passa lentamente. O relógio não dá trégua. Aleluias e gritos de alívio são ouvidos quando chega o horário do almoço e caras de desanimo são vistas quando o horário – que nesta hora passa correndo – se esvai. E assim continuamos com a cara no computador, esperando que o chefe não nos demita, pois as contas do mês nunca esperam.
Terminado o serviço, faço todo o caminho de volta, praguejando pelo forte calor humano dos transportes públicos do país. Dezenas de pessoas num cubículo e o esfrega-esfrega é comum. Isso me lembra varias baratas avançando numa pequena lata de lixo deixada a céu aberto.
Em casa, as coisas também não estão nada fáceis. Mulher em crise, filhos que choram e você não possui o direito de culpá-los, pois o incômodo da vida avança por todos no ambiente. E foi nessa noite que tudo mudou.
Eu suava em bicas a noite. Mas isso não era devido a mal-estar, febre ou qualquer coisa dessas. No fundo estava desesperado, mas não sabia o porquê. Ainda.
Fecho os olhos, e ao longe a sombra vem e toma conta de mim. E o pesadelo começa.
O tempo desta vez avança depressa, mas as cenas que me são mostradas não são, em nenhum momento, boas. A dor, o ódio, o desespero, a magoa, a raiva, o remorso, a agonia estão todos embutidos em mim, como se eu fosse um boneco inflável movido pela bomba de ar do destino. E assim as cenas passam. Eu fico doido e mais doido a cada instante. Eu acordo. Meu coração está a mil por hora e o Capitopril é o comprimido que escolho na primeira prateleira do armário do banheiro. Minha mulher levanta e pergunta o que aconteceu, mas agora já está tudo bem. Volto a fechar os olhos, mas desta vez a sombra me toca de uma maneira diferente.
Desta vez eu me vejo no topo, mandando em todos. Na cadeira do meu chefe sou rei. Em casa sou rei. Na vida sou rei. O tempo passa depressa também, mas minha majestade é suficientemente grande para que este fator passe despercebido. Então o alarme toca. Tudo começa novamente e o simples empregado refaz aquele mesmo percurso, porém seus miolos agora estão totalmente remexidos.
Ao chegar na empresa, recebo a todos com um belo sorriso e o pessoal, em uma forma instintiva, o retribuem. Até meu chefe está melhor hoje. Tudo estava indo bem, até a hora em que meu chefe me ordena que eu vá a sua sala por um instante. Eu já sabia o que era, minha demissão estava mais do que clara.
- Ernesto... Estamos fazendo cortes na empresa e... Você sabe como é...
- Eu já sei senhor, pego minhas coisas hoje mesmo e seguirei minha carreira... mas antes, queria dizer que você é um mau chefe, não dirige bem a empresa, bebe igual a um cachaceiro, é grosso, ignorante, idiota e fica traindo sua mulher com a secretária Josefina. Mas você é o único que não percebe que sua mulher é bem famosa por aqui. Já saiu com quase todos os homens desse andar... Bom... finalmente disse tudo o que precisava dizer. Até mais, panaca!
- Ernesto, Ernesto... Você ERA um bom funcionário... iria te promover para o meu cargo, pois recebi uma oferta melhor e também pela grana que a empresa ganhou cortando gastos, mas pela sua... digamos... franquesa, não saio daqui sem antes te dar um pé na bunda! Até mais... panaca...
E assim eu saio da sala, cheio de raiva... quem disse que os sonhos não mudam a vida de uma pessoa? Pois é... Agora o jeito é voltar pra casa e aguentar os sermões da patroa... A vida continua afinal.

Lucas de Figueiredo

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