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sábado, 5 de novembro de 2011

O Inteligente e Estúpido

Finalmente descobrimos o que é a vida. Todas as religiões caíram por terra depois da revelação da notícia ao mundo, porém não poderia dizer se a ciência realmente prevaleceu, pois a único avanço que conseguimos obter foi a capacidade de ouvir o que os antigos povos — aqueles que foram dizimados com a conquista da América — ouviam. Descobrimos que a vida não passa de uma dança.
Seria uma espécie de dança eterna que entrelaça as primeiras relações com as últimas. Assim como uma semente é deixada para trás por uma árvore que morre, ou um zigoto que nasce de uma fecundação amorosa e depois sofre a tristeza de perder seus pais, ou ainda como um novo formigueiro que nasce alguns metros após de outro, que já perdeu sua rainha. “O fim é o começo, se ele começa, ele termina”, foi o que Edward D. Morrison não parou de repetir na convenção internacional de ontem. Não há espíritos, não há céu, não há inferno, pois esses três foram criações humanas. A vida é somente uma dança que envolve todos os seres e os proporciona toda uma cadeia de sensações.
Contudo, a música modificou seu refrão em um único ponto. E foi o ponto em que a Natureza resolveu arriscar uma inovação. Ela sabia que esta poderia ser maléfica e destrutiva, mas já estava cansada das cadeias evolutivas que tinha criado. Ela não queria criar novos bicos de pássaros, novas pelagens ou mudar o tamanho dos seres. Ela queria algo que pudesse sentir e criar como ela. Ela queria ser dominada, conquistada, amada por um ser que pudesse parecer-lhe superior. A música mudou quando a Natureza criou o homem.
Ela pegou uma linha evolutiva que lhe agradasse e modificou a estrutura do planeta e em alguns milhões de anos, o homem apresentava o que poderia ou não ser seu auge. A própria Natureza acreditava que o apogeu não seria o homo sapiens, pois ela percebia que ele sabia pensar, mas ainda era incapaz de sentir o que sua criadora sentia. Ela prosseguiu com sua nova invenção, mudando ligeiramente o planeta, separando os continentes cada vez mais, em busca de fazer o homem evoluir. Mas o que ela não tinha percebido é que, sem querer, ela deixou a semente da mudança florescer no homem. Os humanos progrediam bem até o começo do século XV da contagem anual que eles mesmos tinham criado. Porém, após esse tempo, eles começaram a modificar os planos de sua “Mãe” radicalmente, assim como uma criança que começa a bisbilhotar os projetos de seu pai e desordena todo o progresso conquistado. E foi assim que o mundo seguiu, aumentando sua nova contagem do tempo e que agora se encontra em 2473 anos de existência. A dança, que não tinha fim, começa a baixar seu volume diante das ações feitas pelos seres pensantes que a própria Natureza criou. O começo aos poucos encontra seu fim, no mesmo ponto de partida.
E foi no ano de 2468 que o homem descobriu o que sua “Mãe” queria. Em 2468 o ser humano resolveu parar e ouvir finalmente o que a Natureza queria dizer. O que ele escutou? Uma frase e sucessivas e infinitas lamúrias.
Então o homem compreendeu que evoluiu tarde demais. Teria evoluído no tempo certo se não tivesse trucidado os Maias e os Astecas, pois eles já sabiam ouvir. A dança, que na verdade é baseada na conexão das gerações anteriores com as posteriores, já está prevista para acabar antes de chegar ao terceiro milênio. Essa dança necessita do amor entre suas gerações e de um espaço favorável, suportado pela Natureza. Porém o homem destruiu esse suporte e o fim começou a mostrar-se: a água tornou-se cinza juntamente com o ar, o solo adquiriu marcas imutáveis, as folhas secaram e os seres foram se extinguindo, um a um.
E agora, o que faremos? Pensaram os até então nomeados “Grandes Homens”. Não podemos reconstruir a Natureza do ponto em que esta se encontra. Não podemos fingir que nada aconteceu.
As lamúrias da Terra continuam a soar e a única coisa que o homem pode fazer é arrepender-se do que fez e reconfortar-se ouvindo a frase que sua “Mãe” lhe disse antes de lhe falar suas lamúrias, no intuito de perdoar o ser humano e levar um último fio de alegria em sua vida: “O fim é o começo, se ele começa, ele termina”.
O homem de hoje tenta enganar-se com o pretexto de que tudo tem que ter um fim simplesmente para conter o desespero provocado pela culpa, mas todos sabem que isto não é verdade e a dor não desaparece do horizonte. A dor não desaparece nem da Terra, nem do homem, a inteligente e estúpida criação feita pela Natureza.

Lucas de Figueiredo

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