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sexta-feira, 14 de junho de 2013

Morrendo para estar vivo - Capítulo 6 Fuga

Joana ficou semanas sem conseguir encostar as costas em lugar algum, Maria Antonieta tinha agora uma cicatriz feia do lado direito do rosto, mas não fazia caso disso, dizia pra quem perguntasse que tinha tropeçado e caído em uma ladeira e metera o rosto em uma pedra, Jô se sentia mal pelo sofrimento que a amiga estava passando, as duas estavam sem jantar à dias e embora Antonieta não reclamasse não era certo prejudicá-la, principalmente porque a revoltada ali era a “nega safada”, como era chamada sempre que a freira ficava irritada com algo que ela fazia, e somente ela deveria pagar o preço das suas afrontas.
A noite já tinha caído há muito tempo, a morena estava deitada na cama, silenciosa, o toque de recolher já tinha sido dado há mais de duas horas, o silêncio no recinto era perene, a amiga loira estava deitada na cama ao lado, resfolegava baixinho, estava em sono profundo.
Joana se levantou silenciosa, as mãos recolhendo o tênis e a mochila que estavam debaixo da cama, vestiu a jaqueta que estava dependurada no cabide, não tinha sequer se trocado, mas não deixou ninguém perceber, fora deitar antes de todos, se cobrindo com o cobertor até o pescoço, ninguém atrapalharia seus planos, e então, depois, voltaria para buscar a amiga.
Os passos foram ágeis até a porta, abriu-a com delicadeza e deu uma última olhadela para a amiga que não demonstrava sinal de acordar.
Ela sabia que a maldita bruxa não as deixava ir embora porque assim recebia dinheiro do governo, mas não aceitaria mais ser serviçal daquela vadia.
O corredor estava escuro, porém as tentativas de fugas de Joana já foram tantas que ela conhecia cada pedaço daquele lugar até de ponta cabeça. Todos dormiam, ela só teria que passar pelo dobermann preto que ficava cuidando da porta e estaria livre... Mas esse era um problema, o animal além de feroz era muito bem treinado para morder qualquer um que passasse por ali, exceto a nojenta da sua dona.
Ela enfiou a mão dentro da mochila, retirou um pedaço de carne que pegou no intervalo daquela manhã, quem sabe ele não fosse trouxa o bastante? Torcia para que sim.
Desceu as escadas pé ante pé, o bicho estava deitado em frente à porta.
Era agora ou nada, ela não tinha medo dele e sim do barulho que ele poderia vir a fazer. Apertou a carne entre os dedos e pisou no último degrau, um rangido barulhento em meio aquele silêncio se fez ouvir e o bicho se ergueu ouriçado, mostrando os dentes para ela que rapidamente jogou a carne longe, vendo que não surtira o menor efeito.
Logo ele estaria latindo e acordando todo mundo, e além de receber mais um belo castigo ela perderia uma oportunidade divina, pois sabia que quando essas coisas ocorriam o sinal de alerta ficava acionado por pelo menos um mês, a velha trancava as portas dos quartos e com a grade nas janelas se tornava impossível sair dali.
Retirou um estilete do bolso da calça, apontando para o cachorro que não se sentia nem um pouco ameaçado.
-Chispa, sai!
Ela sussurrava baixinho, com o estilete apontado para o animal. De repente o bicho veio correndo em sua direção e ela não pensou duas vezes, atirou o estilete nele e saiu correndo para a cozinha, o jeito iria sair pelos fundos.
Entrou tropicando na cadeira que soltou a bomba alerta com seu barulho estridente em meio aquela calmaria, se xingou por aquela burrice mas não parou pra pensar nos prejuízos, a luz do corredor já se acendia, ela correu para a porta que dava para o quintal.
-Quem está fazendo essa zona?
A velha berrava do segundo andar, o cachorro começava a latir alto.
Joana forçava a maçaneta, mas estava trancada, se recostou na mesa e meteu o pé no vidro, estourando-o e pulando para fora.
-Joana é você sua vagabunda? Acha que pode fugir de mim? Você vai ver só o que vou fazer com você quando te catar!
A voz se aproximava, a garota se encontrava do lado de fora, cercada por muros altos e considerados de classe.
-Você me estourou a porta, me aguarde! Mas o que...?
A mulher era ágil quando queria. Joana começava a escalar o muro, a mão esquerda sangrando com o caco que lhe acertou, mas ela não tinha tempo pra isso, algo estava atrasando a madre e ela agradecia por isso, seja lá o que quer que fosse, ela seria eternamente grata.
-Saia daqui sua vadia, saia de cima de mim!
Ela berrava dentro da casa, Joana pulou o muro sentindo algo estralar em sua perna e uma dor horrível se possuir de seu corpo, mas ela só pensava em correr.
-Maria Antonieta, eu te mato!
Foi a última coisa que Joana ouviu antes de desaparecer na noite.

Jéssica Curto


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